Outro dia, saindo pra levar meu filho na escolinha, dei de cara com duas mulheres indo trabalhar, conversando pelo caminho, bastante animadas. Mas o que tem isso de mais? Nada, se naquele momento não tivesse notado uma coisa: eu não as notei antes. Como assim? Todo dia, elas passam por aquele mesmo caminho, naquele exato momento em que estou tirando o carro e saindo com meu filho. Assim como nao as notava, não notava a dupla de corredores que passavam pela rua lateral, já a caminho da escolinha. Também não notava meu vizinho tirando o lixo, ou o caminhão de água parando sempre no mesmo ponto da rua. Daí lembrei do Truman, saindo pra trabalhar e repetindo sempre os mesmos movimentos e passando sempre pelas mesmas situações, sem notar que era apenas um personagem, atuando na ficção que era sua própria vida. Imaginei que, como Truman, um dia eu poderia "acordar" e perceber isso a tempo de tomar as rédeas da minha vida. E senti que ao fazer isso, estaria abrindo mão de tudo o que tinha como certo até então, me despindo de todas as coisas que eu tinha, ou melhor, que me tinham, e assim, aparentemente sem nada, poderia então começar a viver. Só o que faltava era coragem. A coragem de encarar o fato de que tudo o que eu tinha não é nada, que precisarei talvez começar do zero, e a essa altura do campeonato é super-humano recomeçar. Mas é também a coisa mais saudável a se fazer. Recomeçar a linda e maravilhosa história da minha vida. Da minha vida real.
Mais um tabu quebrado. Não é porque eu escolhi um caminho "errado", ou melhor justamente por causa disso, não devo persistir no erro e continuar nesse caminho. a vida nos proporciona retornos, desvios, e quem toma a iniciativa de voltar atrás não deve de jeito nenhum se considerar ou ser considerado fraco. É preciso espírito forte, porque será um caminho novo, talvez nem tão seguro, mas é preciso tentar, porque pior do que se arriscar a um novo fracasso é teimar no antigo fracasso, só por ser mais cômodo, ou pela ilusão de que as coisas irão se ajeitar com o tempo.
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